CENÁRIO EXTERNO GANHA MAIS PESO NAS CONTAS NACIONAIS E ANALISTAS JÁ VEEM JURO MENOR EM 2011

SÃO PAULO - O agravamento da crise global já leva alguns economistas de mercado a projetar uma queda da taxa básica de juros (Selic) neste ano, algo impensado duas semanas atrás. Embora ainda seja uma posição minoritária, chama a atenção porque revela que o cenário externo ganha cada vez mais peso nas análises de médio e longo prazos da economia brasileira.

Até porque, internamente, a inflação continua pressionada, como mostrou ontem o IPCA-15 de agosto. A prévia do índice oficial do País subiu 0,27% e, nos últimos 12 meses, acumula variação de 7,1%. A meta do governo é de 4,5%, com margem de tolerância de dois pontos para cima ou para baixo - entre 2,5% e 6,5%. Ou seja, a inflação está rodando, como se diz no jargão do mercado, acima do teto da meta. A economista-chefe da BNY Mellon ARX Investimentos, Solange Srour, acredita que a Selic encerrará 2011 em 11,5%, ante os atuais 12,5% ao ano. Ela prevê duas quedas de 0,5 ponto porcentual nas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) de outubro e novembro. O argumento principal de Solange centra-se na provável reação do Banco Central (BC) à piora da conjuntura internacional, e não pela evolução da inflação. Para ela, aliás, o IPCA continuará pressionado, em grande medida, pela demanda interna. Tanto que projeta o índice a 6,4% neste ano e 5,5% no ano que vem. "Desde o estouro da crise em 2008, as autoridades têm preferido atuar preventivamente, temendo uma desaceleração mais forte da economia", disse. Ou seja, o BC brasileiro (como muitos de seus pares) têm preferido errar por falta do que por excesso no que se refere ao juro. O ex-diretor do BC José Julio Senna, sócio da MCM Consultores, também vê a Selic em 11,5% no fim do ano. O economista trabalha com dois cenários. No primeiro, que classifica de "ruim", as economias desenvolvidas ficam anos crescendo pouco, o que puxa para baixo a atividade global, inclusive a brasileira. No "muito ruim" - que, por ora, tem probabilidade de 25% ante 75% do outro -, a Selic cai mais em 2012 e encerra o ano em 8,75%. O cenário "muito ruim" é o que considera a hipótese de calote em alguma economia da Europa, com efeito sobre o sistema financeiro. Bancos da região têm posições enormes em títulos públicos dos variados países e, em caso de calote (ou até mesmo reestruturação), perderiam dinheiro. Isso travaria o mercado de crédito no planeta, como em 2008. Senna ressalta que a consultoria tenta prever o que o BC fará. "Se eu estivesse lá, tenderia a ser mais cauteloso." O economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, também vê a Selic menor já em 2011. "Está tudo muito incerto no exterior. Até os mais pessimistas têm se surpreendido a cada dia", disse. Para ele, o IPCA terá alguma resistência no curto prazo, mas "é difícil imaginar um cenário de pressão inflacionária em 2012". Para ele, a Selic termina 2011 em 12%. Leandro Modé, de O Estado de S. Paulo